segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012


Filosofia – Texto 10 – Filosofia da Linguagem (Parte II)



A Origem da Linguagem:


Durante muito tempo a filosofia preocupou-se em definir a origem e as causas da linguagem.

Uma primeira divergência sobre o assunto surgiu na Grécia: a linguagem é natural aos homens (existe por natureza) ou é uma convenção social? Se a linguagem for natural, as palavras possuem um sentido próprio e necessário; se for convencional, são decisões consensuais da sociedade e, nesse caso, são arbitrárias, isto é, a sociedade poderia ter escolhido outras palavras para designar as coisas. Essa discussão levou, séculos mais tarde, à seguinte conclusão: a linguagem como capacidade de expressão dos seres humanos é natural, isto é, os humanos nascem com uma aparelhagem física, anatômica e fisiológica que lhes permite expressarem-se pela palavra; mas as línguas são convencionais, isto é, surgem de condições históricas, geográficas, econômicas e políticas determinadas, ou, em outros termos, são fatos culturais. Uma vez constituída uma língua, ela se torna um sistema dotado de necessidade interna, passando a funcionar como se fosse algo natural, isto é, como algo que possui suas leis e princípios próprios, independentes dos sujeitos falantes que a empregam.

Perguntar pela origem da linguagem levou a quatro tipos de respostas:

1.                          A linguagem nasce por imitação, isto é, os humanos imitam, pela voz, os sons da natureza (dos animais, dos rios, das cascatas e dos mares, do trovão e do vulcão, dos ventos, etc). A origem da linguagem seria, portanto, a onomatopéia ou imitação dos sons animais e naturais;

2.                          A linguagem nasce por imitação dos gestos, isto é, nasce como uma espécie de pantomima ou encenação, na qual o gesto indica um sentido. Pouco a pouco, o gesto passou a ser acompanhado de sons e estes se tornaram gradualmente palavras, substituindo os gestos;

3.                          A linguagem nasce da necessidade: a fome, a sede, a necessidade de abrigar-se e proteger-se, a necessidade de reunir-se em grupo para defender-se das intempéries, dos animais e de outros homens mais fortes levaram à criação de palavras, formando um vocabulário elementar e rudimentar, que, gradativamente, tornou-se mais complexo e transformou-se num língua;

4.                          A linguagem nasce das emoções, particularmente do grito (medo, surpresa ou alegria), do choro (dor, medo, compaixão) e do riso (prazer, bem-estar, felicidade). Citando Rousseau em seu Ensaio sobre a origem das línguas:



Não é a fome ou a sede, mas o amor ou o ódio, a piedade a cólera, que aos primeiros homens lhes arrancaram as primeiras vozes... Eis por que as primeiras línguas forma cantantes e apaixonantes antes de serem simples e metódicas.

Assim, para Rousseau, a linguagem, por nascer das paixões, foi primeiro linguagem figurada e por isso surgiu como poesia e canto, tornando-se prosa muito depois; e as vogais nasceram antes das consoantes. Assim como a pintura nasceu antes da escrita, também os homens primeiro cantaram seus sentimentos e só muito depois exprimiram seus pensamentos. 

Essas teorias não são excludentes. É muito possível que a linguagem tenha nascido de todas essas fontes ou modos de expressão, e os estudos de psicologia genética (isto é, da gênese da percepção, imaginação, memória, linguagem e inteligência nas crianças) mostram que uma criança se vale de todos esses meios para começar a exprimir-se. Podemos dizer que uma linguagem se constitui para a criança (e para todos os seres humanos), quando ela passa (ou todos passamos) dos meios de expressão aos meios de significação. Um gesto ou um grito exprimem, por exemplo, medo; exprimem um sentimento; palavras, frases e enunciados significam o que é medo, dizem qual é o sentido do sentimento do medo.


O que é a Linguagem?


A linguagem é um sistema de signos ou sinais usados para indicar coisas, para a comunicação entre pessoas e para a expressão de ideias, valores e sentimentos. Embora tão simples, essa definição da linguagem esconde problemas complicados com os quais os filósofos têm-se ocupado desde há muito tempo. Essa definição afirma que:

1. A linguagem é um sistema, isto é, uma totalidade estruturada, com princípios e leis próprios, sistema esse que pode ser conhecido;

2. A linguagem é um sistema de sinais ou de signos, isto é, os elementos que formam a totalidade lingüística são um tipo especial de objetos, os signos, ou objetos que indicam outros, designam outros ou representam outros. Por exemplo, a fumaça é um signo ou sinal de fogo, a cicatriz é signo ou sinal de uma ferida, manchas na pele de um determinado formato, tamanho e corsão signos de sarampo ou de catapora, etc. No caso da linguagem, os signos são palavras e os componentes das palavras (sons ou letras);

3. A linguagem indica coisas, isto é, os signos lingüísticos (as palavras) possuem uma função indicativa ou denotativa, pois como que apontam para as coisas que significam;

4. A linguagem estabelece a comunicação entre os seres humanos, isto é, tem uma função comunicativa: por meio das palavras entramos em relação com os outros, dialogamos, argumentamos, persuadimos, relatamos, discutimos, amamos e odiamos, ensinamos e aprendemos, etc.;

5. A linguagem exprime pensamentos, sentimentos e valores, isto é, possui uma função de conhecimento e de expressão, ou função conotativa: uma mesma palavra pode exprimir sentidos ou significados diferentes, dependendo do sujeito que a emprega, do sujeito que a ouve e lê, das condições ou circunstâncias em que foi empregada ou do contexto em que é usada. Assim, por exemplo, a palavra água, se for usado por um professor numa aula de química, conotará o elemento químico que corresponde à fórmula H²O; se for empregada por um poeta, pode conotar rios, chuvas, lágrimas, mar, líquido, pureza, etc.; se for empregada por um criança que chora pode estar indicando uma carência ou necessidade como a sede.


A definição nos diz, portanto, que a linguagem é um sistema de sinais com função indicativa, comunicativa, expressiva e conotativa.

No entanto, essa definição não nos diz várias coisas. Por exemplo, como a fala se forma em nós? Por que a linguagem pode indicar coisas externas e também exprimir ideias (internas ao pensamento)? Por que a linguagem pode ser diferente quando falada pelo cientista, pelo filósofo, pelo poeta ou pelo político? Como a linguagem pode ser fonte de engano, de mal-entendido, de controvérsia ou de mentira? O que se passa exatamente quando dialogamos com alguém? O que é escrever? E ler? Como podemos aprender uma outra língua?



Obs. Texto retirado na íntegra do Livro – Convite à Filosofia de autoria de Marilena Chauí.



Dicas de Leitura:


- O Mundo precisa de Filosofia – Eduardo Prado de Mendonça
- A Peste – Albert Camus

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