Filosofia – Texto 5 – Sócrates
(479 – 399 a.C.)
Sócrates talvez seja o personagem mais enigmático de toda a história
do pensamento ocidental. Ele não escreveu uma linha sequer, e não obstante,
está entre os homens que exerceram maiores influências na humanidade.
Sabemos que Sócrates nasceu em Atenas e que ali passou toda a sua
vida, sobretudo nas praças do mercado e nas ruas, onde conversava com toda a
sorte de pessoas, sem fazer distinção entre elas.
Conhecemos a vida de Sócrates, sobretudo através de seu principal
discípulo Platão. Podemos exagerar dizendo que a filosofia de Platão nasce da
morte de Sócrates, a qual ele considerava um escândalo. Mas quando Platão dá a
palavra a Sócrates não podemos afirmar com toda a certeza que foi Sócrates que
realmente disse tais palavras. Por isso não é fácil separar os ensinamentos de
Sócrates dos de Platão.
O ponto central de toda a atuação de Sócrates como filósofo estava no
fato de que ele não queria propriamente ensinar as pessoas. Para tanto, em suas
conversas, Sócrates dava a impressão de ele próprio querer aprender com o seu
interlocutor. Ao “ensinar”, ele não assumia a posição de um professor
tradicional. Ao contrário da metodologia da sua época, Sócrates dialogava,
discutia. Mas Sócrates não teria se tornado tão importante se apenas ouvisse o
que os outros diziam e nem seria condenado à morte por isso. Geralmente, o
começo de uma conversa, Sócrates só fazia perguntas, como se nada soubesse.
Durante a conversa, freqüentemente conseguia levar seu interlocutor a ver os
pontos fracos de suas próprias reflexões e argumentações. Uma vez “pressionado
contra a parede”, o interlocutor acabava reconhecendo o que estava certo e o
que estava errado no seu discurso.
Dizem que a mãe de Sócrates era parteira, e o próprio Sócrates
costumava comparar a atividade que exercia com a de uma parteira. Não é a
parteira que dá a luz ao bebê, ela só fica por perto para ajudar durante o
parto. Sócrates achava, portanto, que sua tarefa era ajudar as pessoas a
“parir” uma opinião própria, mais acertada, pois o verdadeiro conhecimento tem
de vir de dentro e não pode ser obtido “espremendo-se” os outros. Só o
conhecimento que vem de dentro é capaz de revelar o verdadeiro discernimento. A
capacidade de dar a luz é uma característica natural. Da mesma forma, todas as
pessoas podem entender as verdades filosóficas, bastando para isso usar a sua
razão. Quando uma pessoa “toma juízo”, ela simplesmente traz para fora algo que
já está dentro de si.
E justamente porque fingia não saber de nada, Sócrates forçava as
pessoas usarem a razão. Sócrates era capaz de se fingir ignorante, ou de se
mostrar mais tolo do que realmente era. Chamamos isto de Ironia Socrática. Foi dessa maneira que ele conseguiu expor as
fraquezas do pensamento dos atenienses. E isso podia acontecer em qualquer
lugar, no meio de toda gente. Um encontro com Sócrates podia significar
expor-se ao ridículo e ao riso do grande público. Não é de espantar, portanto,
que ele incomodasse e irritasse muitas pessoas, sobretudo os que detinham poder
e influência na sociedade.
No ano de 399 a.C. Sócrates foi acusado de “corromper a juventude” e
de “não reconhecer a existência dos deuses”. Por uma maioria apertada, Sócrates
foi condenado à morte, considerado culpado por um júri de cinqüenta pessoas.
Ele poderia ter pedido clemência, poderia ter salvado sua vida se concordasse
em deixar Atenas. Mas se tivesse feito isso não seria ele mesmo e iria contra
tudo o que pregou a sua filosofia. O ponto é que ele considerava sua própria
consciência e a verdade mais importante do que sua própria vida. A sentença foi
cumprida pouco depois da condenação, na presença dos amigos mais íntimos,
Sócrates bebeu um cálice de cicuta.
A Sócrates interessava o homem e suas ações, exatamente aquelas tidas
como virtuosas, numa época em que ser virtuoso é quase sinônimo de ser cidadão.
Entre seus diálogos questionava o que era a sabedoria, a beleza, a coragem, a
justiça, fazia para chegar a questão principal que era o que é a virtude?
Conhecer a virtude tornou-se assim, o principal objetivo do verdadeiro
conhecimento – só pratica o mal quem ignora o que seja a virtude. E quem tem o
verdadeiro conhecimento só pode agir bem. Nesse sentido conhecimento e virtude
tornam-se sinônimos.
Com Sócrates, as questões morais deixam de ser tratadas como
convenções baseadas nos costumes, as quais se modificam conforme as
circunstancias e os interesses, para se tornar problemas que exigem do
pensamento uma elucidação racional. Nesse sentido, Sócrates é o fundador da
Ética.
Um dos juízes perguntou a Sócrates se ele não se envergonhava de ter
se dedicado por uma vida inteira a uma atividade pela qual foi condenado a
morte. Ele respondeu:
“Estás enganado, se pensas que um homem de bem deve ficar pensando, ao
praticar seus atos, sobre as possibilidades de vida ou morte. O homem de valor
moral deve considerar apenas os seus atos, se eles são justos ou injustos,
corajosos ou covardes...”
Bibliografia Consultada:
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Editora
Ática, 2003.
GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia. São Paulo: Companhia
das Letras, 2008.
Dicas de Leitura:
- O conceito de Ironia: constantemente referido a Sócrates – S.A
Kierkegaard
- Á vida feliz – Sêneca
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