Prof. Maicon Martta
“O homem só
conhece o mundo dentro de si se toma consciência de si mesmo dentro do mundo”.
Goethe
O homem sempre se manteve numa posição privilegiada
dentre os seres do universo. De acordo com Giordano Bruno, filósofo italiano da
Renascença, ele, o homem, se situa no limite entre eternidade e tempo,
participando de ambos[1].
Caracteriza-se no tempo, sendo filho do seu próprio tempo, vivendo sua
historicidade e realizando os seus feitos no passar da história; na eternidade,
com as obras realizadas e a cultura perpetuada, cultura esta que é o que melhor
nos diferencia dos demais seres.
O homem, diferentemente de outros animais, é o único
que pode fazer escolhas, é o único que pode se posicionar diante os fatos e
realidade da natureza. Ao observarmos a natureza, podemos ver castores
fabricando diques dentro de rios, e abelhas em colméias fabricando o mel. Por
que abelhas não constroem diques e por que castores não fabricam mel? Tanto
castores como abelhas são determinados biologicamente a agir dessa ou daquela
forma, o que significa dizer que eles não tem escolha. Uma abelha não decide na
última hora que não quer mais fabricar mel e muito menos diz que daquele
momento em diante vai se portar como um castor e construir um dique que pode
ser muito mais divertido. O homem por sua vez, pode dizer SIM, ou NÃO, ou ainda
pode dizer talvez, apresentando dessa forma, sua tendência natural à dúvida e,
consequentemente, a reflexão sobre sua maneira de agir.
Ao fazer escolhas, o homem se coloca numa posição de
destaque na natureza, principalmente por ter consciência de suas escolhas, por
raciocinar sobre aquilo que quer, por saber que quer. Dessa forma, dizemos que
o ato de pensar e refletir a realidade é um ato estritamente humano, reservado
somente ao homem, assim como o ato de fazer filosofia, de pensar
filosoficamente o mundo.
A filosofia nasceu por volta do século VII a.C. na
Grécia, mais precisamente nas colônias gregas da Ásia menor. Ela surgiu como
alternativa para contrapor a explicação mitológica de mundo, que era uma
explicação dúbia e sem maior aprofundamento intelectual. O que a filosofia faz,
e faz desde suas origens, não é encontrar uma utilidade para as coisas, mas uma
explicação racional para todas as coisas existentes, em outras palavras, a
filosofia é um fim em si mesma. Etimologicamente Filosofia significa, Amor,
busca ou ainda, amizade pela sabedoria, denotando assim sua incansável busca
pela essência das coisas, pelo conhecimento.
Se reconhecendo no mundo como um amante da sabedoria (um
filósofo), o homem procura o entendimento de si mesmo e do mundo. Dessa forma,
o homem é um animal diferente. É um animal que sabe, e mais do que isso, é um
animal que sabe que sabe: homo sapiens
sapiens. O homem tem consciência do mundo a sua volta, o que não acontece
com outros animais. A consciência é o que nos permite ter cultura nos
diferenciando assim dos demais seres. Mas o que é consciência? É nada mais do
que o desenvolvimento dessa atividade mental que nos permite estar no mundo com
algum saber, “com-ciência”. O homem é
capaz de fazer sua inteligência debruçar sobre si mesma para tomar posse do seu
próprio saber, avaliando sua consistência, seu limite e seu valor.
O processo contínuo de conscientização faz do homem um
sistema aberto, fundamentalmente relacionado com o mundo e consigo mesmo. O
homem é o único ser capaz de voltar-se para dentro de si investigando o seu
íntimo, assim como projetar-se para fora, investigando o universo. Aberto ao
Ser e ao saber, a conscientização faz o homem um ser dinâmico, eterno
caminhante destinado à procura e ao encontro da realidade. Caminhante cuja
estrada é feita da harmonia e do conflito com o Ser, o Saber e o Fazer,
dimensões essas que são essenciais da existência humana.
Em conseqüência desse processo de conscientização e
reflexão, o homem pensa o mundo e a si mesmo. Mas para pensar o mundo, o homem
primeiro passou a admirar o mundo, seu movimento, sua grandiosidade, sua
sacralidade. O mundo foi o primeiro objeto de reflexão da filosofia. E essa
reflexão só foi possível através da Admiração.
Para ilustrar esse momento de “admiração” vamos fazer um exercício
mental. Imagine-se chegando a nossa galáxia, a Via Láctea. Durante milhares de
anos você voa sem rumo entre as estrelas e os sistemas solares. De vez em
quando, gira em torno de um planeta – sem enxergar o menor sinal de vida. Você
já está prestes a ir embora quando, de repente, avista um planeta transbordando
de vida no meio de uma das múltiplas espirais da galáxia. Nesse exato momento
você acorda. A viagem foi um sonho! Mas você percebe que o planeta que
descobriu em seu sonho é o planeta onde você vive[2]. Parabéns,
você acabou de descobrir que seu planeta transborda em vida, algo simples e
fascinante e passa a se admirar com isso e a ver o mundo de maneira diferente.
Um olhar de quem acabou de acordar para algo novo e incrível, um olhar de quem descobre
a origem do filosofar.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
GAARDER, Jostein; HELLERN, Victor e NOTAKER, Henry. O
Livro das Religiões, São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
RABUSKE, Edvino A. Antropologia Filosófica,
Petrópolis – RJ: Editora Vozes, 1987.
*
Texto adaptado do artigo “A Alegoria da Caverna de Platão e a origem do
Filosofar”, apresentado no II Congresso Internacional de Ética, epistemologia e
educação, apresentado em 26 de setembro de 2005.
[1]
Cf. RABUSKE, Edvino A. Antropologia
Filosófica, 1987.
[2] Cf. GAARDER, Jostein; HELLERN,
Victor e NOTAKER, Henry. O Livro das Religiões, 2002.
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