INDÚSTRIA CULTURAL:
A comercialização da arte e seu reflexo[1]
Prof. Maicon Martta
Parte 1:
Com o advento da
modernidade e expansão do capitalismo, um efeito causado pelas revoluções
testemunhadas pelo Séc. XVIII, uma nova sociedade passou a se desenvolver: a
sociedade de consumo.
Em relação ao consumo,
não podemos nos abster e nos considerarmos fora do sistema. Todos nós consumimos. Consumir é satisfazer
necessidades, no entanto, não podemos ser hipócritas e dizer que não
extrapolamos essas necessidades. Ao extrapolarmos nossas necessidades básicas,
nos tornamos consumistas e membro participativo dessa sociedade iniciada no começo do Séc.
XIX e que vem crescendo de forma assustadora a cada ano. Nós, com poucas
exceções, fazemos parte de uma comunidade de consumo.
Os seres humanos,
diferentemente dos outros animais, possuem mais do que necessidades
fisiológicas e materiais. O humano sente necessidade de se humanizar e para tal, precisa de outros bens além do que se encontram no mercado ou nas lojas de
conveniências. Por ser dotado de razão e sentimento, o homem necessita de bens
culturais, além de fazer perpetuar o seu lado emotivo. Sendo assim, ele
necessita se relacionar com o outro, no seio de sua família, na alegria de
amigos e pessoas queridas, assim como extravasar suas angústias em bens
simbólicos, como a arte.
Com o crescimento das
cidades, fenômeno notório após a Revolução Industrial, a necessidade de se
adquirir bens simbólicos se tornou tão exigente quanto à necessidade de se
adquirir bens materiais. Com os problemas sociais, que afloraram juntamente com
o desenvolvimento das cidades e a mudança repentina do espaço urbano, surgiram
também problemas existenciais, angústias e ressentimentos. E como fármaco para
esses males modernos, a Arte ascendeu como medida renovadora.
Não obstante, o seu
efeito restaurador, a Arte, ainda era restrita para poucas pessoas, geralmente as que
eram consideradas mais cultas. Apesar disso, a partir do inicio do Séc. XX, com
a difusão dos meios de comunicação, novos artistas começaram a surgir e com
eles novas manifestações artísticas, principalmente no cenário musical. Dessa
forma, com o desenvolvimento das rádios, desenvolveu-se também uma nova
manifestação musical, que passou a atender as grandes massas. Diante desta
respectiva, pensadores passaram a analisar este fenômeno e refletir sobre os
seus efeitos. Os primeiros a analisarem os efeitos comerciais da arte, em
especial da música, foram os pensadores da chamada Escola de Frankfurt.
O conceito de Indústria Cultural surgiu pela primeira
vez na década de 40, mais precisamente no ano de 1947 na obra Dialética do Esclarecimento, de Theodor
W. Adorno e Max Horkheimer. Segundo estes autores, o novo cenário que se
formava, com o desenvolvimento do cinema, a disseminação da literatura em
revistas, livros de bolso e da música, constituíam um novo sistema[2].
Este novo sistema, que os autores acentuam, é um sistema de consumo, em que a
própria Arte se descaracterizava para se transformar num produto, ou, num negócio.
Escreve Adorno e Horkheimer:
[...] O cinema e o rádio não precisam mais se
apresentar como arte. A verdade de que não passa de um negócio, eles a utilizam
como uma ideologia destinada a legitimar o lixo que propositalmente produzem.
Eles definem a si mesmos como indústrias, e as cifras publicadas dos
rendimentos de seus diretores gerais suprem toda dúvida quanto à necessidade
social de seus produtos.[3]
Fica evidenciada, na
citação a posição dos autores quanto à composição das obras que eram intituladas
como arte. Uma posição que, se pararmos para refletir, não está tão
desatualizado, basta meditar sobre algumas letras de músicas, vazias em
conteúdo e melodia. Adorno era musicólogo e um músico excelente, por esse
motivo não poupou críticas ao cenário musical de sua época e à pobreza de suas
composições. Também não poupou críticas ao cenário que essas obras estavam
inseridos, motivados por uma indústria que invés de servir como fármaco, levava
à alienação. Alienação essa que vinha mascarada pelo lucro obtido pelas vendas. Aqui já havia ficado denotado uma crítica a razão instrumental que mediaria todo esse processo.
Ao visarem à produção em
série e à homogeneização, as técnicas de reprodução sacrificam a distinção
entre o caráter da própria obra de arte e do sistema social. Por conseguinte,
se a técnica passa a exercer imenso poder sobre a sociedade, tal ocorre,
segundo Adorno, graças, em grande parte, ao fato de que as circunstâncias que
favorecem tal poder, são arquitetadas pelo poder dos economicamente mais fortes
sobre a própria sociedade. Em decorrência, a racionalidade da técnica
identifica-se com a racionalidade do próprio domínio. Por esse motivo, Adorno classifica
a música de rádio e o cinema, como “negócios” e não como Arte; existe uma
poderosa Indústria por trás de todos esses eventos.
Para Adorno e Horkheimer,
a indústria cultural, ao aspirar à integração vertical de seus consumidores,
não apenas adapta seus produtos ao consumo, como determina o próprio consumo.
Interessada nos homens apenas enquanto consumidores ou empregados, a indústria
cultural reduz a humanidade em seu conjunto, assim como cada um dos seus
elementos às condições que representam seus interesses. O que acaba por
determinar o próprio conceito de gosto, como se verá mais adiante.
Sugestão de Leitura:
- Dialética do Esclarecimento - Adorno e Horkheimer.
[1]
Adaptado do artigo original intitulado “A
comercialização da arte e seu reflexo na educação”, apresentado como
comunicação no 1ª Congresso Internacional sobre filosofia na Universidade,
promovido pelo Departamento de Filosofia do Centro de Letras e Ciências humanas
da UEL (Universidade Estadual de Londrina), no Paraná no período de 10 a 12 de maio de 2006.
[2] Cf.
ADORNO, Theodor W., HORKHEIMER, Max. Dialética
do Esclarecimento, 1985.
[3] ADORNO,
Theodor; HORKHEIMER, Max. Dialética do
Esclarecimento, 1985, p. 114.
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