segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014


INDÚSTRIA CULTURAL:
A comercialização da arte e seu reflexo[1]
Prof. Maicon Martta
Parte 1:

Com o advento da modernidade e expansão do capitalismo, um efeito causado pelas revoluções testemunhadas pelo Séc. XVIII, uma nova sociedade passou a se desenvolver: a sociedade de consumo.
Em relação ao consumo, não podemos nos abster e nos considerarmos fora do sistema. Todos nós consumimos. Consumir é satisfazer necessidades, no entanto, não podemos ser hipócritas e dizer que não extrapolamos essas necessidades. Ao extrapolarmos nossas necessidades básicas, nos tornamos consumistas e membro participativo dessa sociedade iniciada no começo do Séc. XIX e que vem crescendo de forma assustadora a cada ano. Nós, com poucas exceções, fazemos parte de uma comunidade de consumo.
Os seres humanos, diferentemente dos outros animais, possuem mais do que necessidades fisiológicas e materiais. O humano sente necessidade de se humanizar e para tal, precisa de outros bens além do que se encontram no mercado ou nas lojas de conveniências. Por ser dotado de razão e sentimento, o homem necessita de bens culturais, além de fazer perpetuar o seu lado emotivo. Sendo assim, ele necessita se relacionar com o outro, no seio de sua família, na alegria de amigos e pessoas queridas, assim como extravasar suas angústias em bens simbólicos, como a arte.
Com o crescimento das cidades, fenômeno notório após a Revolução Industrial, a necessidade de se adquirir bens simbólicos se tornou tão exigente quanto à necessidade de se adquirir bens materiais. Com os problemas sociais, que afloraram juntamente com o desenvolvimento das cidades e a mudança repentina do espaço urbano, surgiram também problemas existenciais, angústias e ressentimentos. E como fármaco para esses males modernos, a Arte ascendeu como medida renovadora.
Não obstante, o seu efeito restaurador, a Arte, ainda era restrita para poucas pessoas, geralmente as que eram consideradas mais cultas. Apesar disso, a partir do inicio do Séc. XX, com a difusão dos meios de comunicação, novos artistas começaram a surgir e com eles novas manifestações artísticas, principalmente no cenário musical. Dessa forma, com o desenvolvimento das rádios, desenvolveu-se também uma nova manifestação musical, que passou a atender as grandes massas. Diante desta respectiva, pensadores passaram a analisar este fenômeno e refletir sobre os seus efeitos. Os primeiros a analisarem os efeitos comerciais da arte, em especial da música, foram os pensadores da chamada Escola de Frankfurt.
O conceito de Indústria Cultural surgiu pela primeira vez na década de 40, mais precisamente no ano de 1947 na obra Dialética do Esclarecimento, de Theodor W. Adorno e Max Horkheimer. Segundo estes autores, o novo cenário que se formava, com o desenvolvimento do cinema, a disseminação da literatura em revistas, livros de bolso e da música, constituíam um novo sistema[2]. Este novo sistema, que os autores acentuam, é um sistema de consumo, em que a própria Arte se descaracterizava para se transformar num produto, ou, num negócio. Escreve Adorno e Horkheimer:

[...] O cinema e o rádio não precisam mais se apresentar como arte. A verdade de que não passa de um negócio, eles a utilizam como uma ideologia destinada a legitimar o lixo que propositalmente produzem. Eles definem a si mesmos como indústrias, e as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores gerais suprem toda dúvida quanto à necessidade social de seus produtos.[3]

Fica evidenciada, na citação a posição dos autores quanto à composição das obras que eram intituladas como arte. Uma posição que, se pararmos para refletir, não está tão desatualizado, basta meditar sobre algumas letras de músicas, vazias em conteúdo e melodia. Adorno era musicólogo e um músico excelente, por esse motivo não poupou críticas ao cenário musical de sua época e à pobreza de suas composições. Também não poupou críticas ao cenário que essas obras estavam inseridos, motivados por uma indústria que invés de servir como fármaco, levava à alienação. Alienação essa que vinha mascarada pelo lucro obtido pelas vendas. Aqui já havia ficado denotado uma crítica a razão instrumental que mediaria todo esse processo.
Ao visarem à produção em série e à homogeneização, as técnicas de reprodução sacrificam a distinção entre o caráter da própria obra de arte e do sistema social. Por conseguinte, se a técnica passa a exercer imenso poder sobre a sociedade, tal ocorre, segundo Adorno, graças, em grande parte, ao fato de que as circunstâncias que favorecem tal poder, são arquitetadas pelo poder dos economicamente mais fortes sobre a própria sociedade. Em decorrência, a racionalidade da técnica identifica-se com a racionalidade do próprio domínio. Por esse motivo, Adorno classifica a música de rádio e o cinema, como “negócios” e não como Arte; existe uma poderosa Indústria por trás de todos esses eventos.
Para Adorno e Horkheimer, a indústria cultural, ao aspirar à integração vertical de seus consumidores, não apenas adapta seus produtos ao consumo, como determina o próprio consumo. Interessada nos homens apenas enquanto consumidores ou empregados, a indústria cultural reduz a humanidade em seu conjunto, assim como cada um dos seus elementos às condições que representam seus interesses. O que acaba por determinar o próprio conceito de gosto, como se verá mais adiante.

Sugestão de Leitura:

- Dialética do Esclarecimento - Adorno e Horkheimer.



[1] Adaptado do artigo original intitulado “A comercialização da arte e seu reflexo na educação”, apresentado como comunicação no 1ª Congresso Internacional sobre filosofia na Universidade, promovido pelo Departamento de Filosofia do Centro de Letras e Ciências humanas da UEL (Universidade Estadual de Londrina), no Paraná no período de 10 a 12 de maio de 2006.
[2] Cf. ADORNO, Theodor W., HORKHEIMER, Max. Dialética do Esclarecimento, 1985.
[3] ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. Dialética do Esclarecimento, 1985, p. 114. 

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